sexta-feira, 4 de março de 2022

Publicação 1 - Série Biogás

P1 - Reaproveitando o biogás gerado nas ETEs, digestores de resíduos orgânicos e aterros sanitários 

O biogás é o principal produto gerado na digestão anaeróbia de matéria orgânica. Esse gás pode ser gerado tanto na digestão resíduos sólidos como líquidos. O principal constituinte do biogás é o metano CH4, no entanto há outros gases presentes, como CO2 (dióxido de carbono), N2 (nitrogênio) e H2S (sulfeto de hidrogênio). O biogás pode ser utilizado para vários fins, pois possui elevado poder calorífico inferior (PCI). Para se ter idéia, o PCI do gás natural é de 31,8 MJ.Nm³, já o PCI do biogás bruto (isto é, sem etapa de purificação) é de 25,1 MJ.Nm³. Caso o biogás passe por uma etapa de tratamento e purificação e seja obtido o CH4 puro, esse valor chega a aproximadamente 36 MJ.Nm³.

No post de hoje, vamos responder apenas 3 perguntas iniciais sobre o biogás:
1) Qual a melhor forma de reaproveitamento do biogás? 
2) 
O biogás gerado no tratamento de esgoto é o mesmo gerado em aterros sanitário e em digestores de lodo? Existe alguma diferença?
3) 
O que é esse biometano? É possível obter hidrogênio a partir do biogás? Como se obter o famoso "biometano"?


Figura 1 - Ônibus movido a biogás

Qual a melhor forma de reaproveitamento do biogás? 

O biogás possui elevada energia química e isso pode ser transformado em energia térmica, elétrica ou mecânica. Na transformação em energia térmica, podemos utilizar o biogás como fonte de energia para produzir calor para cozimento (nesse caso, armazenamento do gás e uso como gás de cozinha). Também é possível queimar o biogás e utilizar o calor para higienização e secagem do lodo e escuma. Na transformação em energia elétrica, podemos utilizar o biogás em motores CHP e gerar energia elétrica que pode ser utilizado nas bombas, sopradores, etc. Já na transformação em energia mecânica, o biogás pode ser utilizado como combustível veicular e até mesmo industrial.

As fotos abaixo mostram as possíveis aplicações do biogás.

Figura 2 - Terminal de abastecimento de veículos com biogás
Figura 3 – Biogás armazenado para ser utilizado posteriormente para produção
Figura 4 – Queima direta de biogás sem reaproveitamento em plantas de tratamento de esgoto (reatores anaeróbios)

O biogás gerado no tratamento de esgoto é o mesmo gerado em aterros sanitário e em digestores de lodo?

O biogás pode ter composição variada de acordo com as características dos resíduos ou do esgoto. Conforme foi citado, além do CH4, o biogás é composto por CO2 e N2. Vamos comparar, por exemplo, o biogás gerado em um reator UASB tratamento esgoto sanitário com o biogás gerado em um digestor de lodo (tabela abaixo).


Tabela 1 – Comparativo do biogás gerado em reator UASB x Digestor de Lodo

Como pode ser observado, o biogás do reator UASB (tratando esgoto sanitário), geralmente apresenta maior teor de CH4, H2S e maior teor de N2. A elevada concentração de N2 presente no biogás de reatores UASB, se comparado ao de digestores de lodo, pode estar relacionada à solubilização do ar atmosférico (78% de N2 no ar) no esgoto afluente, sendo liberado para a fase gasosa no interior do reator anaeróbio. Já as baixas concentrações de CO2 no biogás se devem à elevada solubilidade desse composto no líquido. Em resumo, não existe um padrão de biogás. A depender do tipo de resíduo ou de esgoto, as características do biogás podem variar. Ainda sobre as características do biogás, é importante citar que as elevadas concentrações de N2 no biogás de reatores UASB inviabilizam a obtenção de um gás com concentração de CH2 acima de 90% (biometano), visto que o processo para remoção de N2 é substancialmente complexo (Brasil, 2017), podendo ser considerado impraticável na realidade atual das ETEs brasileiras. Dessa forma, apenas o biogás gerado em digestores de lodo apresenta características favoráveis à produção de biometano e, eventualmente, de hidrogênio.

O que é o biometano? É possível obter hidrogênio a partir do biogás?

O biometano é o gás resultante do processo de purificação do biogás. Quando o biogás coletado passa por um processo de tratamento e purificação, este pode tornar-se biometano. Para isso é necessário a remoção de CO2 e outros gases, de forma que o gás final possua concentração de CH2 acima de 90%. Ainda nessa pergunta, é importante citar que é possível utilizar o biometano para produção de hidrogênio. A Figura abaixo mostra as etapas de tratamento do biogás para obtenção de biometano e as etapas para obtenção de hidrogênio a partir de biometano.

Figura 5 – Tratamento do biogás e respectivos usos

Na Figura acima, podemos verificar que o biogás com concentração de CH4 entre 60 – 80%, precisa inicialmente passar por um processo de desidratação (retirada de umidade), para posteriormente ser utilizado em motores de acionamento direto ou combustão em caldeira. Caso seja visado a cogeração (isto é, obtenção de energia elétrica e aproveitamento do calor de forma simultânea), deve ser realizado, além da desidratação, a retirada de H2S. Para obtenção do biometano e uso do gás como componente na forma de GNV ou até mesmo uso industrial, além de desidratação e dessulfurarão, deve ser realizado a retirada de CO2.

Por fim, para a geração de hidrogênio em biometano, deve ser utilizado células combustíveis. Melhores detalhes na Figura abaixo.

Figura 6 – Usos do biogás e tratamento requerido

Considerações finais desse post
Dentre as principais aplicações do biogás estão: (i) combustão direta para produção de calor - cozimento, aquecimento de água, caldeira (vapor), higienização e/ou secagem de lodos; (ii) produção direta de eletricidade; e (iii) geração combinada de calor e eletricidade. Com relação, ao uso da biometano, cabe destacar a recente autorização no Brasil da injeção de biometano oriundo de ETEs na rede de gás natural (vide Resolução da Agência Nacional de Petróleo nº 685/2017 – ANP, 2017). Com relação ao tratamento do biogás, as técnicas de remoção de umidade e de H2S são consideradas quando o aproveitamento de energia elétrica e térmica for o objetivo do tratamento, e a combustão direta em queimadores quando o aproveitamento energético não for praticável ou houver sua paralisação.


Esse artigo foi escrito por Silvio Rollemberg, professor, pesquisador e consultor técnico de várias ETAs e ETEs. Contato: silviorollemberg@gmail.com | silvio.rollemberg@ifce.edu.br

 

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